sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Ensaio.

Olhando em seus olhos, pareço mais frágil do que jamais fui. Começo de modo decidido, firme, e digo: te amo. Sim, te amo, por que o espanto? Tenho o direito de amar, também, mesmo que tenha escolhido amar errado. Escolhi um amar tão sofrido, tão descompassado, tão bobo, tão meu.
Começamos bem, éramos um par, sempre fomos. "Completa ela, e vice-versa, que nem feijão com arroz", era o que diziam. Sim, ainda somos um belo par, uma pena não termos rendido tudo o que esperavam de nós, talvez por isso esteja sendo assim: porque esperaram demais, porque esperamos demais. Expectativas geram frustrações. O que era natural foi se tornando rotina, e há uma diferença entre isso.
Nunca tinha reparado, mas seus olhos me trazem paz... E aqui me encontro, contemplando essa paz que me fita sem saber o que pensar, prefere calar, certo, fique calado, é melhor assim, não me interrompa, eu termino de falar num instante. Por que estou falando, afinal? Sei que meus olhos expressam o que quero dizer bem melhor do que minhas palavras, mas, talvez, esteja falando para que você se distraia e não veja que em meus olhos ainda há o brilho da esperança de ser sua, e só sua; de ter você para mim, assim, simples, quieto, meu, como um dia eu pensei que você fosse. Mas acho que você nunca foi, nunca quis ser.
Olhe, me perdoe, entendi tudo sempre errado demais, me frustrei por querer, assumo. Você não deve ter feito nada de extraordinário, mas que mania boba essa que eu tenho de fantasiar, deu no que deu. Agora estou aqui, olhando pra você, querendo apenas fechar os olhos, beijar seus lábios e fingir que estamos bem, que somos um. Mas não somos, cansei de fingir, cansei de sofrer. Mas quero que saiba que, pra você, sempre haverá espaço nesse coração. Que serei sempre sua: sua amiga, sua conselheira, sua querida, sua. E só sua.

Daí eu saio e fecho a porta sem olhar pra trás, como que virando uma página da minha vida, da nossa vida. Como que pondo um ponto final naquilo tudo. Não olho pra trás ou por estar decidida demais, ou por medo de me arrepender. Só saberia o porquê se olhasse, mas não o fiz. E aí, acabou.
Fechar a porta não foi só a porta da sala, foi a porta que eu um dia abri pra você. Aquela porta pela qual você entrou, mas pela qual insiste em não sair.

- E aí, o que achou?
- Pena que, na teoria, a coisa é tão mais fácil... Mas a cena vai ficar realmente bonita.
- Ah, a cena... É...

sábado, 19 de dezembro de 2009

Guarda-chuva azul.

Silêncio. Os olhares já não eram os mesmos de outrora, aqueles olhares fascinados com o começo de algo tão bom. Agora, os olhos pareciam aflitos, preocupados, como se alguma coisa tivesse que ser dita, mas nenhum dos dois tinha coragem para isso.
- Lembra que era ali que você estava naquele dia?
- E você apareceu na hora certa. Você e seu guarda-chuva azul.
Mais silêncio. Sim, eles lembravam de tudo. Lembravam que, a partir do momento que ele tentou protegê-la da chuva, passaria a protegê-la de tudo mais. A chuva era apenas o princípio, ele a protegeria de todo o mundo, se fosse possível.
- Seu perfume me agradou. E, desde aquele tempo, você nunca mudou.
- Você disse que gostava. Não mudei por isso.
Primeiro o perfume, depois o sorriso. Nessa ordem, necessariamente. Mas, agora, eram os olhos dele que a chamavam, porque pareciam preocupados. Ela também devia parecer preocupada, pois ele a interrogava com o olhar, ela sentia.
- Se você vai dizer, diga logo. Não aguento mais esperar.
Dizer, dizer o que? Ele havia feito uma promessa. Prometera que era com ela que iria estar pra sempre. Que estaria com ela em qualquer momento, que as chuvas que viessem a cair seriam barradas por aquele guarda-chuva azul.
- Sabe que eu sempre vou gostar de você. É que...
- Não é mais como era, eu sei.
Ela sabia. Não queriam mentir um para o outro. Pior: não conseguiam mais mentir um para o outro, doía até mesmo pensar em fazer isso. Seria desonesto se algum dos dois o fizesse. Mais silêncio.
- Então...
- Eu quis te levar nos braços, lembra? Você que não deixou.
- Claro, eu mal te conhecia.
- E seu pé quebrado? Você não podia andar naquela chuva toda daquele jeito...
- Mas andei.
Teimosa como sempre, ela. E ele admitia: achava um charme toda aquela teimosia e o modo como ela arqueava as sobrancelhas ao argumentar.
Mais e mais e mais silêncio. A garçonete ia e vinha com seus cafés, sucos, chás. O mundo passava, e eles ali. Os pés dele se movendo nervosamente, os dedos dela tamborilando na superfície da mesa.
- Eu...
- Sabe que gosto de você. Por favor, nunca me deixe.
- ...nunca vou deixar você. Prometi, não foi?
- Mas tudo parece tão diferente agora. Você parece estar aqui mais por obrigação do que por vontade.
- Eu nunca faria isso, e você sabe. Seria te magoar ainda mais, coisa que eu jamais faria.
- É que...
- Vem.
O dinheiro ficou em cima da mesa - e a garçonete achou muito generosa aquela gorjeta toda. A chuva começava a cair, fininha, leve. E o guarda-chuva azul ficou recostado na cadeira, esquecido. Hoje, eles queriam sentir a água lavar suas almas.

sábado, 5 de dezembro de 2009

Et pluribus unum

"Assim: olha, eu sei que o barco tá furado e sei que você também sabe, mas queria te dizer pra não parar de remar, porque te ver remando me dá vontade de não querer parar de remar também.
Tá me entendendo? Eu sei que sim."
Caio Fernando Abreu


Impressionante como elegemos pessoas para os cargos que precisamos. Amigos para ouvir, amigos para abraçar, amores platônicos, pessoas para rir, pessoas para bem-querer, pessoas para mal-querer, enfim. E o mais interessante disso tudo é que são tantas as pessoas que temos pra escolher e, algumas vezes, escolhemos alguém sem nem saber por que motivo escolhemos. Et pluribus unum. E quando a gente escolhe, nem sempre a pessoa sabe que foi escolhida. É uma outorga, uma quase lei para nós, mas um fato desconhecido para nosso eleito, algumas vezes. Daí vem a nossa boa e velha amiga frustração. Porque, óbvio, nem todos estão aptos aos cargos que lhes designamos. Pior do que a inaptidão: muitos não querem mesmo o cargo. Sinto que se alguns de meus eleitos soubessem que, de alguma forma, têm um papel importante para mim, olhariam em meus olhos e diriam: "mas por que raios você me escolheu pra isso, sua louca?". Paciência. Melhor não deixar que eles saibam, seria estrago demais: pra mim e, talvez, para eles. Mas é divertido e patético tudo isso. Porque, por mais fortes e independentes que sejamos, sempre haverá algo que nos falta. Ninguém pode viver sozinho, isso é fato. Somos auto-suficientes, e nossa companhia nos basta, mas, será que nós queremos isso? Um alguém pra contar uma piada boba, ou um segredo antigo, ou uma novidade, é, sim, uma necessidade. Não que tenhamos que viver sempre cercados por pessoas, não é isso - até porque temos que estar a sós alguns momentos, pra nos encontrarmos de vez em quando. Mas que a vida seria quase insuportável sem nossos "eleitos", isso seria.





(Centésima postagem. Um daqueles pequenos feitos.)

sábado, 7 de novembro de 2009

Outono.

Sempre souberam que ela diferente. Frente às outras crianças, seu semblante sereno a fazia parecer mais velha, como alguém cujo corpo não acompanhou o ritmo do pensamento, ela que sabia que ser criança era uma prisão que teria que suportar.
Um dia, ao caminhar distraída, pensando na injustiça que é ter nove anos e opiniões reprimidas e julgamentos sufocados, viu algo tão belo que seus profundos olhos castanhos, talvez pela primeira vez na vida, brilharam como olhos de criança fascinada.
Aquilo era, talvez, a coisa mais linda que já havia visto. Olhar sério, nariz adunco, profundas olheiras, mas a elegância de um príncipe. Seu príncipe, assim o chamou. A seriedade dele parecia confrontá-la, ela que sempre era mais séria do que todos que a rodeavam. Sentiu em seu corpinho miúdo pulsações que não sabia explicar. Era como se o desejo de tê-lo a mantivesse viva, como se houvesse, enfim, encontrado um pouco de sentido na vida que levava.
Ele ali, sentado, observando os transeuntes, não a percebeu. Devia ser, para ele, apenas mais uma garotinha entre as folhas amareladas. Isso a feria, mas, tudo bem, era uma dor suportável. Enquanto pudesse olhá-lo e vê-lo, tudo seria suportável.
Uma voz a chamou, não, ela não queria ir, teve que ir, súplica alguma foi suficiente para amansar o olhar feroz da mãe, que a comandava.
Sozinha, percebeu que vê-lo uma vez, apenas, não era suficiente. Seu magro corpo tremia ao pensar que aquela teria sido a primeira e única chance que tivera de contemplar seu amado. Adormeceu entre lágrimas e soluços.
No dia seguinte, atônita, buscou naquela tarde seu sentido e eis que o viu: sério, centrado, elegante e seu. Parecia cumprir o mesmo ritual todos os dias: sentar naquele banco da praça e contemplar cada sutileza que a vida poderia trazer-lhe.
Dia após dia, ela se dava o direito de observá-lo. Era como se um prazer a invadisse de uma forma única, como se todo aquele descontentamento em ser criança não houvesse, como se tivesse conseguido ir além.
Com o passar do tempo, naquele rosto de homem sério começaram a surgir marcas da vida, acompanhando as olheiras que ele sempre levava consigo. E o corpo de menina passou a corpo de moça.
Moça essa que se desesperava ao pensar que aquilo pudesse chegar ao fim. E se, por alguma obra do destino, um dia ele não viesse? Tinha que imortalizá-lo de alguma forma. Não permitiria que dele restassem apenas frágeis lembranças, as quais poderiam ser levadas por qualquer leve sopro de esquecimento.
Pôs-se a tentar eternizá-lo no branco de uma tela, tal qual a tela que eram seus olhos que refletiam a imagem daquele homem todos os dias, até aquele em que ele foi para nunca mais voltar, ela sabia, sabia que aquela era a última vez que o veria, que aquele último suspiro dado por ele antes de ir para casa era um suspiro de adeus. Ela, porém, nada disse, sequer um adeus, para não desfazer o encanto que, há anos, os envolvia, uma aura de segredo e silêncio.
Passou a querer, então, a imagem perfeita daquele que era sua razão de existir. Não saía mais, dedicando-se inteiramente à imagem dele, imagem essa que deveria ser tão plena quanto ele fora um dia.
E as horas viraram dias; os dias, meses; os meses, anos. E a moça virou mulher, mulher tão dedicada ao seu propósito que nem a fome, a sede ou a ameaça da loucura pareciam poder afetá-la.
Em uma noite, então, sentiu que havia terminado. Sim, ali estava ele, tão sério, com aquele olhar que um dia encantou a menina e que hoje encantava a mulher. Estava ali, tão perto que podia tocá-lo, tão real que podia sentí-lo.
Então, depois de tanto tempo, ela conseguiu dizer, apenas:
- Me leve.
E os dois saíram a caminhar sobre folhas amareladas.

domingo, 18 de outubro de 2009

Iceberg.

Bom dia, tudo bem?, e a família, a gasolina subiu, meu Deus, onde o mundo vai parar?, acho que esqueci a carteira, me empresta sua blusa?, acho que sábado é um bom dia, pizza lá em casa mais tarde?, choveu demais, eu pago a conta, me espera, mãe, eu quero!, meu horóscopo diz que hoje é um bom dia para o amor, comprei a maionese, olha aquela garota, já disse que odeio matemática?, vou ao banheiro, não esquece o carrinho, pega o agasalho que está frio, qual o pedido?, prefiro creme sem passas, vou pintar as unhas de vermelho, experimenta isso, vem comigo, sai daqui, hoje eu vou sair, adoro aquele poema, canta comigo aquela canção?, agora eu vou dormir...








A gente se mostra tão pouco. O resto é segredo, submerso no nosso mar.

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Olhos vivos.

Tudo passando, todos passando. Só quer respirar, limita-se a usar toda a força que lhe resta para trazer um pouco de ar para si, para que ele possa viver por mais alguns minutos, ao menos. Mal sabe que sua agonia reflete tanto a dor de tanta gente, gente que todo dia sufoca nesse mundo louco, suplicando por um pouco de ar a cada segundo. Morreu com os olhos mais abertos do que nunca, vendo as últimas cores do seu mundo.

sábado, 29 de agosto de 2009

Um minuto, por favor.

Triste é perceber que a gente está deixando coisas simples passarem sem apreciar a beleza delas. Perceber isso foi tão súbito que me doeu. Doeu por eu não lembrar quando tinha sido a última vez que eu tinha olhado o céu, só pra apreciar o quanto ele era belo. A ocupação, os deveres, as cobranças, os compromissos, o cansaço, tudo se unindo como uma venda que me cega cada vez mais. Tudo pesando, desviando meu olhar do alto, prendendo-o ao chão, me fazendo caminhar contemplando meus próprios pés.
Quem me dera poder lembrar sempre que devo olhar pro alto, algumas vezes, e lembrar do quão prazerosas são as mais simples sensações, esquecer de tudo nem que por uns poucos minutos, manter a calma, a serenidade.
Mas o mundo vem me atropelando, e eu não consigo reagir a isso de imediato. Não me conformo com isso. Sufoco, engasgo, até conseguir, finalmente, gritar: grito interno, mas libertador. Desprendo-me das amarras que me prendem ao chão, o céu é meu. O fato de ter deveres a cumprir não pode tirar de mim meus pequenos prazeres. Eu não posso me privar de coisas que me fazem bem, não posso. Ninguém pode, aliás.
A gente vive tão apressado, faz sempre as mesmas coisas, mas, talvez, nunca pare para perceber os detalhes nossos de cada dia.
Você sai, cumpre seu ritual de todos os dias, mas, já parou pra reparar a cor do céu no percurso até a escola? Já disse "bom dia" a todos aqueles que passam por você sempre? Já viu a lua, tão imponente, no céu, ao voltar pra casa? Notar sutilezas custa tempo, tempo é dinheiro, custa dinheiro. Minutos preciosos não podem ser desperdiçados, é verdade. Porque, claro, um minuto vai fazer com que tudo vá pelos ares.
Minutos desperdiçados fazem tudo ir pelos ares, sim. Mas apreciar pequenas coisas, tão importantes, até, não é desperdício. Permitir-se sentir mais não é desperdício. Respirar não é desperdício.
Seria tão bom se a gente não corresse tanto, se o tempo não nos atropelasse tanto, se as coisas não apenas passassem, se o mundo não apenas zunisse, se a gente não se acomodasse, se coisas sérias não se tornassem comuns, se os dias fossem vistos como dias, não como horas. O mundo não pára, a vida não pára, e isso não é preciso: nós é que temos que parar e perceber que o tempo esta conosco, e não contra nós.

sábado, 22 de agosto de 2009

Eu não quero nada que faz doer

Eu não quero chegar um dia e me arrepender tanto das coisas.
Eu quero ter gritado meus "eu te amo", quero ter errado muito, quero ter aprendido muito, quero ter ajudado muito, porque quero ser alguém. Quero viver, não quero existir.
Isso faz parte do meu egoísmo.
Eu quero me permitir errar, quero que meus impulsos me joguem onde nem sei, quero que meus olhos vejam, meus ouvidos ouçam, minha boca diga, minhas mãos toquem.
Eu quero ter, quero pertencer, quero ser infinita nem que seja por milésimos de segundo. Quero um, ou vários, momentos de plenitude. Quero me calar e ouvir só o tempo passar, mas não quero ficar assistindo a passagem dele como quem nada fez.
Eu quero tudo ao mesmo tempo, mas quero cada coisa na sua hora, que é pra aproveitar. Quero tudo e não quero nada.
Quero freios, mas não quero limites!
Quero poder olhar pra tudo e me arrepender, quero me arrepender, sim! Do que eu fiz, do que eu não fiz. E quero me arrepender de não ter tido uma idéia melhor do que viver assim.
Quero chorar até ficar vermelha, quero rir até a barriga doer, quero ter raiva, quero detestar, mas quero gostar, quero amar.
Quero ouvir as outras pessoas, quero me ouvir. Quero conhecer gente nova e quero me conhecer. Nem que eu morra tentanto, eu quero tudo isso!





(Tem conversa que é realmente produtiva).

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Taí.

Fico espantada com a capacidade que o mundo tem de guardar em si tantas pessoas, cada uma tão infinita. É como se a inquietude estivesse presente em todo lugar, como se dentro de um só planeta coexistissem milhões de universos.

domingo, 26 de julho de 2009

Quebrando o ritmo.

Passo, passo, passo, passo, passo.
As mãos suando não querem dizer nada, porque é assim que tem que ser.

- É isso. Termina aqui.

Passo, passo, passo, passo, passo.
Fechou a porta. A única coisa descompassada era seu coração.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Tentação.

Eu estava andando. Em mim, ardia a vontade de que o mundo me pertencesse, já que eu parecia não poder pertencer a ele. Era uma caminhada tranquila, mas minha mente e meus pensamentos estavam em descompasso com meus pés, pois um turbilhão furioso de idéias perturbava minha aparente tranquilidade.
Olhos bem abertos, mente bem aberta, alma aberta ao máximo que minha desconfiança permitia. Queria sentir, queria ver, queria tocar, queria amar, queria saber, queria ousar, queria gritar, queria voar, mas limitei-me a andar e a pensar em coisas que pareciam não ter sentido algum.
Sabia que buscava algo, não sabia o que era. Em meu peito, um desassossego não me permitia ter paz. Buscava no mundo algo que em mim eu não conseguia achar, talvez por incapacidade, talvez por não querer encontrar. Medo. Sim, medo do que eu poderia encontrar. O universo de um ser é algo sempre surpreendente, e não creio estar pronta para meus próprios segredos.
Em busca de mim, olho para o céu. O céu, tão estrelado, parecia sorrir para mim, parecia querer que eu estendesse a mão e tocasse em todos aqueles pontos de luz e esperança. Tentador. Já que meu mundo não se abria em flor para mim, não me permitia descobrir seus segredos, tudo era só mistério, por que não o céu?
Estendi a mão como uma criança que se aventura em algo que ela não desconfia que pode ser arriscado, apenas faz. Toquei o céu, e, ah, quantas estrelas caíram sobre mim!
Era chuva de brilho, era chuva de luz, era chuva de vida. Meus cabelos, minhas mãos, todo o meu corpo refletia sonho, tudo tão intenso, o brilho de uma vida inteira, o brilho de tudo que almejo, de tudo que desejo.
Imersa em estrelas, minha alma mostrava-se através dos meus olhos, mostrava-se de forma tão intensa que transbordou. E de minhas lágrimas surgiam mais estrelas, acompanhadas das que surgiam a cada sorriso meu. Eu era toda luz, toda sonho, era tudo e não era nada. Era infinita, era plena, era única, era eu.
E então ganhei asas, me aventurei, ri, chorei, descobri, sonhei, tudo de uma vez só, como quem se farta de delícias para a alma.

sábado, 27 de junho de 2009

Melodia de uma lembrança.

Voltar pra casa depois de um dia "daqueles" é realmente um exercício de auto-conhecimento. Quieta, respirando, vendo nas poucas estrelas do céu o brilho de uma vida inteira pela frente. Lojas, carros, tudo tão rápido, indo, vindo, como se cada um se resumisse a si mesmo, como se não houvesse uma ligação entre tudo. Vivendo dentro do próprio mundo, com as próprias angústias, os próprios medos, os próprios sonhos.
Mais da metade do caminho, e, de repente, meus olhos já tão sem esperança de encontrar algo o vêem. Ele, recostado na parede, violão nas mãos, olhos fechados, pensamento distante. Canta algo que não consigo ouvir, mas canta com saudade, com ternura, com felicidade, com um sorriso de quem revive em pensamento momentos tão alegres. Uma canção que o lembra uma alegria, uma tristeza, uma realização, um amor, não sei.
Cabelos brancos, as marcas da vida em seu rosto, o jeito pacato de quem já viveu tanto, de quem já teve pressa e, depois de tudo, vê apenas os carros passarem na rua fazendo a melodia da vida, como seus dedos passam pelas cordas do violão fazendo a melodia da saudade.
Em seu rosto já vivido pude ver o sorriso de quem se delicia com doces lembranças, aquelas que nos fazem ver que a vida vale a pena. Que fazer dela o melhor possível, arriscar-se, sorrir, amar, tudo isso vai fazer com que, após algum tempo, a gente possa se sentir bem ao lembrar tudo.
Foram cinco segundos em que senti que a minha vida ainda está apenas começando. E, ah, que eu possa um um dia fechar os olhos e lembrar com saudade de tudo!

sábado, 20 de junho de 2009

Eterna espera.



Pra ver se volta, pra ver se vem.

sexta-feira, 19 de junho de 2009

O impulso ainda pulsa.

Impulso que me doma, me faz dizer o que não podia, crer no que não devia, agir como jamais ousaria. Impulso que me move, que traz à tona meus anseios e angústias, que faz com que, por um momento, eu tenha atitudes que sempre me policiei tanto pra não ter.
Impulso que me arranca as palavras da boca, palavras essas que às vezes ferem, às vezes elogiam, às vezes iludem, às vezes destroem, às vezes supreendem.
Mas piores são aquelas que expressam apenas verdades. Verdades essas que deveriam ser um segredo trancado eternamente, mas que, no tempo de um suspiro, saem como pássaros que anseavam por liberdade. Ah, são essas as verdades que tanto me comprometem, que tanto me fazem ter tanto zelo pelo que digo. Que fazem com que eu queira que, apenas por um momento, eu pudesse voltar no tempo e fazê-las voltar pra o local de onde nunca deviam ter saído.
Mas, o que seria do mundo sem o impulso? Tantas verdades ficariam caladas, trancadas apenas em um coração que, talvez, não mais suporte ter que guardá-las consigo. Tantos beijos de amor sinceros e inesperados seriam contidos, freados simplesmente porque se acha que eles não devem acontecer. Tantas respostas que não seriam dadas apenas pelo fato de que elas podem magoar alguém, mas que magoam muito mais quem não as diz. Tantos gritos seriam sufocados, apenas por serem incovenientes, inadequados.
O impulso é o que move a vida, é o que faz com que pequenos atos possam mudar uma história, um destino. Saber controlar a impulsividade é um dom, mas saber deixá-la fluir livremente de vez em quando é uma virtude.

domingo, 31 de maio de 2009

Aquele sorriso.

Uma semana estressante, de uma vida que também não anda lá essas coisas de calma. Cobranças, medos, incertezas, insegurança, tudo junto em uma mente de 18 anos que não sabe se consegue dar conta de tudo, mas que se esforça como ninguém pra que, no final, tudo dê certo.
Os olhos cansados, a alma cansada, também. Precisava de algo, só não sabia o que era.
No caminho de casa, uma parada. Ah, tudo bem, esperaria pacientemente, era o jeito. Mas a vida, às vezes, parece que faz tudo se encaixar. Bastou olhar para o lado para que percebesse: era daquilo que precisava.
Duas crianças descobrindo as coisas daquele jeito que só elas sabem. Os botões do carro, o volante, tudo parecia tão interessante, o pai assistindo e rindo. Mas eram os sorrisos das crianças que iluminavam a cena toda.
Assistia, quieta, com um sorriso tímido, tudo aquilo. Mas, antes que pudesse perceber, a pequena garotinha a viu. Olhou, desconfiada, mas logo abriu um largo sorriso: o mais lindo já visto.
Aquela tristeza, por um segundo, pareceu sair de mim, como se aquele sorriso fosse um tipo de "ei, acorda, a vida é bela, não fique triste assim".
Logo, os dois, menino e menina, sorriam para mim, a desconhecida, que apenas os admirava, com uma expressão boba, um sorriso contido e olhos cansados.
A alma, outrora cansada, pareceu perceber que ali se encontrava um apoio, por mais que eles não se dessem conta disso, e resolveu fazer-me rir. Gargalhar.
E, por alguns momentos, parecia que não havia cansaço, que não havia tristeza, que não havia nada ruim. Que o que me bastava era olhar tudo com aqueles olhos inocentes, sonhadores.
Mais que isso: me fez ver que um sorriso muda tudo. Pra eles, talvez, apenas mais um sorriso entre tantos, daqueles que a gente dá para desconhecidos na rua. Para mim, foi como uma ajuda vinda de onde eu menos esperava. Tantas pessoas, indo, vindo, e, onde menos se espera, encontra-se um consolo, um apoio. E de forma tão simples, mas tão linda.
Parece não valer nada, mas valeu tanto. E o peso diminuiu, a tristeza por instantes findou, a angústia pareceu algo distante.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Porque permanecer ali era tudo o que tinha que fazer, embora sua mente ousasse libertar-se. Ali, naquela praça, era apenas mais uma a passar, por mais que o vestido dourado a destacasse em meio à multidão que ria. Buscava algum ponto para fixar o olhar, já que era impossível fazer com que os pensamentos permanecessem quietos.
Mostrava no olhar a angústia da espera, esperava por não-sei-o-quê, ela mesma nem sabia mais o que vinha ao seu encontro. Estaria ela esperando por algo que não vem? Adiava o encontro consigo mesma o máximo que podia, afinal, não sabia que danos aquilo poderia causar.
No parque, crianças faziam a vida parecer mera formalidade, como se o importante fosse apenas os giros que a roda-gigante dava no ar, altos e baixos. Os mesmos altos e baixos que ganhavam sentido tão diferente com o passar dos anos, e ela sabia disso.
E ela olhava o parque, as crianças, ouvia risos, sentia a alegria no ar, pairando sobre sua cabeça. Seus olhos mostravam que sua alma ainda guardava a pureza de outrora, por mais que seu corpo, seus atos e seu nome a fizessem parecer tão impura.
Parecia triste, parecia tensa, parecia preocupada. Mas, por instantes, pareceu ser novamente criança, que saltava em uma cama elástica, que dava voltas no carrossel, ah, voltas davam sua vida, agora que era mulher feita. Dos carroséis, guardava apenas doces lembranças, que agora amargavam sua boca com o gosto da saudade do que jamais volta.
A maquiagem dos olhos, agora, estava borrada pelo sal da lembrança. E o que faria? Escondia-se por trás da maquiagem, mas de quem buscava se esconder: dos outros ou dela mesma?
Passos lentos, buscando fazer o tempo passar mais devagar. Se soubesse que sentiria tanta falta dos momentos da infância, teria buscado não apressar a vida, não crescer tão depressa. Ficava a pergunta: ela teria apressado a vida ou a vida a teria apressado? Tantas decisões, tantas mudanças, tão pouco tempo. E de menina a moça, de moça a mulher, tudo no tempo de um suspiro, último suspiro de sua infância.
Agora, apenas lembranças permaneciam, e delas não queria se desfazer, por mais que a dor fosse quase insuportável. Tentava esconder isso de todos, mas dela mesma não podia fugir. Implacável, ela estaria sempre a saber todos os seus segredos.

Um carro azul, um boa noite, foi-se.

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Libélula

Sentiu pela primeira vez o ar em seus pulmões, a claridade de um novo mundo fazia seus olhos doerem, sem ter palavras, chorou. Reconhecia apenas alguns rostos. "Mamã", "Papá", mas que alegria imensa os outros sentiam ao vê-la dizer aquelas palavras. Amor, ah, era isso que eles sentiam por ela. Ousou encarar o mundo por outro ângulo, e depois de cair e erguer-se muitas vezes, conseguiu os tão almejados primeiros passos: sua primeira mostra de independência. E o mundo era desvendado a cada minuto por seus olhos curiosos. As palavras começaram a fazer sentido, agora que conseguia lê-las, de fato. As primeiras amizades, ah, tomara que durem! Crescia, de meninha tornava-se uma mocinha, aqueles primeiros tormentos. O primeiro amor, o primeiro beijo, não, não iria esquecê-los. Ah, a vida parece não dar conta de tudo que se quer fazer, parece que apenas o céu é o limite. Responsabilidades fizeram com que certas inconsequências não fossem mais aceitáveis. De moça a mulher, mulher agora com objetivos, família, uma vida só sua. Era uma mulher feliz, ah, o primeiro filho. Construía agora uma nova realidade. Não era mais tão jovem, via agora a vida que vivera com aqueles olhos de saudade, aquela vontade de fazer tudo outra vez, repetindo até os erros, não, cometendo erros novos. Os cabelos eram nuvens fofas de algodão, agora, e as marcas do tempo se faziam presentes em seu rosto, rosto que agora sorria. Fechou os olhos e dormiu.

domingo, 29 de março de 2009

Mão amiga

Sexta-feira, e no supermercado as filas maiores do que nos outros dias. Parece que necessidade de compras e cansaço caminham juntos, unidos pela falta de tempo nos demais dias da semana. Aquela cesta com o jantar não pesava tanto quanto os olhos, que lutavam para continuarem abertos.
Em meio a tudo isso, alguém se mostrava indiferente. Tinha um objetivo bem maior: brincar com aquela garrafa, gelada, não abria por mais que a mordesse.
Caiu.
Toma, querido, pegue aqui. A chupeta, agora, era seu passatempo.
Com licença. Pois não.
Passou para procurar uma revista, ah, achei, mas, espere. Sentiu o toque de uma pequenina mão segurar seu dedo. A mãe da criança sorria. O bebê parecia estar precisando de um conforto, ah, se soubesse que ele também precisava. Há quanto tempo precisava de uma mão amiga? Muito, e só agora viera a encontrar - e onde menos esperava achar. Dedos tão pequenos, mas que passavam tanta felicidade. Aquele olhar tão inocente, fazendo o bem, sendo gentil apenas porque era de sua natureza, ainda não perdera a pureza de que tanto careceria quando fosse mais velho.
Em um instante que pareceu eterno, o bebê confotava um homem feito. Homem que se sentiu frágil, não sabia como agir, se permitia aquele contato tão íntimo e constrangedor, ou se retirava a mão apressadamente. Olhava nervosamente para a mãe da criança, esta apenas se limitava a tirar as compras do carrinho.
O bebê o fitava, com aqueles grandes olhos que refletiam sua grande alma, alma pura de quem ainda não aprendeu que não se deve demonstrar assim os sentimentos ou que se deve conter as vontades. Bebê que não sabia que apenas ao segurar as mãos de alguém, havia gerado um pequeno distúrbio no equilíbrio anteriormente estabelecido.
O homem, sutilmente, afastou sua mão da pequena mãozinha, que ficou, ainda, a tatear em busca de algo, mas que acabou desistindo. Sorriu, saiu e não olhou para trás.
Dentro de si, torcia para que aquela criança viesse, futuramente, a ser uma mão amiga para muitas outras pessoas. Ah, meu Deus, não permita que a essência desse garoto se perca.


- R$14,90.
- Pode ficar com o troco.

sábado, 31 de janeiro de 2009

Por tempo indeterminado.

Por conta de um "quase" pessoal, deixo aqui, mais uma vez, o meu até breve.
Aviso que pode ser necessário ou não, mas julgo bem deixar aqui expresso que não postarei mais por falta de tempo, não de vontade.
Esse ano é meu, tem que ser. Trabalharei pra que esse ano não haja um "quase", mas sim um "consegui!".
Porque me ensinaram que a persistência é a alma do negócio.

domingo, 18 de janeiro de 2009

Um quase.

Sentada vendo o tempo passar, ouvindo aquela rádio de sempre, com a cabeça encostada na janel do carro do mesmo jeito de sempre, ansiosa por um banho, ah, minha casa, será que os cachorros quebraram alguma coisa? De repente, aquele grande ônibus azul. Mais curioso que o ônibus por si só é a figura que o persegue. Mochila nos ombros, olhar desesperado e grandes passos, um grito, ele não pode deixá-lo escapar. O alcança. As portas, porém, não se abrem. Ele tenta, insiste, mas nada adianta. Ele se vai, reconhecendo o "quase lá".

Interessante como na vida há sempre esses "quase lá". Correr atrás de algo, desejar, precisar, tudo isso nem sempre parece suficiente para que se alcance. O pior: alcançar de maneira não plena. Como chegar perto, tocar e deixar escapar.
Pode ser um desejo, uma pessoa, uma pequena realização pessoal. Pior do que falhar é a dor do quase. Porque quase conseguir mostra que faltou muito pouco paara que o que era apenas idealizado se tornasse real, objetivos não alcançados, sejam eles grandes ou pequenos.
Falhar por muito mostra incompetência, falhar por pouco mostra capacidade insuficiente. Ou suficiente, mas não totalmente. Saber que o que se fez foi quase o bastante para que tudo saísse como o esperado, mas que por algum infortúnio não foi o suficiente é realmente pesaroso.
Ter que "deixar para a próxima" por muito pouco. Um pouco que, em outra situações, seria o quase nada. Sempre, sempre é quase nada, a menos quando se precisa desse pouco, seja esforço, empenho, ou até mesmo sorte.
Ter que esperar minutos, dias ou até mesmo meses por algo apenas por ter falhado na última hora.
Mas pior do que ter que esperar por tudo isso é conformar-se e não mais esperar. Falhar por muito pouco e deixar que isso seja suficiente para acomodação, aceitando a oportunidade perdida, sem lutar para que ela seja alcançada. Pior do que o quase é a acomodação.

Ele se foi, reconhecendo o "quase lá", mas em seus olhos via-se a determinação do "será da próxima vez".

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Eu sei, não é assim.

Tinha tudo pra ser e não era. Impressionante. Admirável. Sabia que era desejado, querido, quase inalcançável para algumas. Mas era simples, gentil. Era simples, simplesmente.
Caminhava despreocupadamente, sem a pretensão de prender minha atenção. Tarde demais, eu já estava alheia, percebendo apenas aqueles passos, aquele sorriso, aquele jeito despreocupado, incrivelmente leve.
Passou, olhou-me como quem olha alguém de passagem, desviou o olhar. Seria eu tão repugnante? Estaria ele buscando não perder-se em mim? Arrisco na primeira opção. Mais aceitável.
Ah, quisera eu ter sabido o que sei dele agora. Certamente teria ousado. O abordaria dizendo alguma tolice cuidadosamente planejada para que pudesse vir a gerar algum diálogo.
Tolices foram ditas, diálogos gerados, nada mais.
Para ele, mais uma. Para mim, mais um (digo isso com um certo pesar, de fato). Mas eis como o destino (ou seja lá o que for) quis.
Não era pra ter sido assim. Aliás, uma série de outras coisas não eram pra ter sido como foram. Grãos de amor perdidos pelo caminho, que triste. Mas aconteceu, e nunca saberei como seria se tivesse ocorrido tudo de outra maneira. Talvez eu não fosse essa que aqui escreve. Não, com certeza não seria. A vida é cheia dessas coisas, vai entender.
Adorável, ele continua.