sábado, 15 de março de 2008

Parte um

Chegou, sentou-se ao meu lado. Fiz que não vi, obviamente. Se não me conhece, que não sente ao meu lado. Ponto.
Vi que tentava inutilmente formar alguma frase em sua mente que iniciasse um diálogo entre nós - e pela sua expressão, parecia descartar todas as possibilidades de 'Como o dia está bonito!' ou 'O que você acha do último escândalo do Governo?'. Limitou-se a fitar a parede do lado oposto da sala, enquanto eu observava pelo canto dos meus olhos suas mínimas reações.
Cruzou as pernas. Abriu uma revista. Olhou algumas fotos. Descruzou as pernas. Olhou mais algumas fotos. Cruzou novamente as pernas. Fingiu ler algo. Jogou a revista em um canto. Fitou a parede.
Um conflito estava ocorrendo diante dos meus olhos. Senti a agonia de alguém que não sabe o que dizer, e que precisa desesperadamente falar algo. Pareceu-me que ia explodir, ali, na minha frente. Parecia retorcer o cérebro em busca de algo para me dizer, qualquer pequena pergunta. Depois de iniciar o diálogo, tudo seria mais fácil, pensava.
Levantou, tomou um gole d'água. Sentou. Ficou a pensar. E a parede nunca havia parecido tão interessante.

- Com licença, poderia me dizer que horas são?

Depois dessa pergunta, meus dias jamais seriam os mesmos.

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