sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Despedida.

Estava na hora, não havia mais porque adiar o inadiável. Vestiu-se e partiu. Ia com aquela certeza incerta que só os decididamente confusos trazem consigo, sabia exatamente o que fazer. Nas mãos, uma gaiola; no peito, sentimentos mil que transbordavam e pareciam querer sair por seus olhos. Caminhava lentamente, como que fazendo sua despedida sem dizer uma palavra. O pássaro a olhava curioso, mas, ao mesmo tempo, parecia estar contente e orgulhoso pela decisão que ela estava tomando. Os passos faziam um barulho macio na areia batida, nas folhas caídas, e ela continuava sua caminhada sem pressa, aproveitando os últimos momentos que restavam daquela companhia. Não sabia onde estava indo, mas sabia que o a mente e o coração saberiam ao chegar. O cheiro de chuva recém caída invadia seus pulmões, trazendo uma sensação prazerosa.
O pássaro aguardava lentamente, balançando naquela gaiola que havia sido por algum tempo seu lar, admirando aquela que fora sua companheira e estranhando o porquê de algumas lágrimas, tendo em vista que chorar, para ele, era algo estranho. Para consolar aquela que tanto amava, pôs-se a cantar a suave melodia que embalara tantos momentos que ambos haviam vivido juntos, para acalmar o coração de ambos.
Havia chegado a hora. Aquele era o lugar. Um campo, uma colina à frente, árvores sussurrando segredos aos seus ouvidos. O pequeno companheiro agora estava calado. Lembranças percorriam sua mente: risos, lágrimas, realizações, decepções, conquistas... muita vida, enfim. Abriu a portinha da gaiola. O pássaro, para quem voar nunca havia sido estranho, hesitou por um momento. Sentiu o pesar nos olhos da dona, mas, aos poucos, deixou-se ir, sentindo como despedida o toque macio de dedos em sua plumagem fofa. Voou para longe, sentindo a liberdade entre as asas. Entoou o canto mais lindo que ela já havia ouvido.
Após algum tempo, ela decidiu que era hora de partir. Mais um pássaro ela havia libertado, sabia que era assim que deveria ser: as coisas acabam para que outras possam começar. O pássaro ganhava os céus, a garota ganhava paz e a certeza de que mais pássaros viriam. Sua gaiola continuaria aberta para o próximo que se instalaria e passaria com ela mais um tempo, até que fosse hora de libertá-lo, também.
Nas asas e no coração do pássaro, ele e sua amiga voavam livres.

2 comentários:

Mar disse...

Oi, Maíra, boa tarde!!
Bem, tenho algumas coisas por fazer...
A primeira é pedir perdão pela demora em visitá-la, no meio da correria em que me meti. Espero que me perdoe.
A segunda seria agradecer-lhe, tão tardiamente, pela visita e pelo comentário carinhoso que me fez.
A terceira, que deveria ser a primeira e única no caso, é dizer que este é um dos trechos mais lindos que li, considerando 2010 e 2011.
Você tem o absoluto domínio da prosa, o perfeito domínio das palavras e dos sentimentos. É um texto raro, lindo, pleno, ao final do que a gente tem uma expressão que resume o sentimento:
- Uau!
Beijo carinhoso
Lello

Rafael Ayala disse...

Poxa, depois do comentário de cima, eu fico até meio encabulado de comentar hehehe.
Eu não sei muito de teoria literária não e nem sei falar bonito, mas tu escreve muuuito bem!
Não cansa, pelo contrário, dá vontade de ler mais.
É um texto carregado de sentimento em tudo, de uma leveza e de uma beleza que eu vou te contar, vontade de ler mais...
Beijos e abraços e um ótimo 2011 para todos nós!
=]