sábado, 17 de maio de 2008

Placebo.

Caminhou pelo apartamento vazio. Aquele era o dia. Percebera desde que havia acordado. Olhou ao redor e viu que tudo estava exatamente como sempre estivera. Aqueles móveis, aqueles livros, aquela vida. Mas tudo iria mudar.
Foi à cozinha, tomou um copo d'água. "Repitam: incolor, inodora e insípida, muito bem!".Sempre gostou mais do copo azul, mas seu irmão insistia que era dele. "Não quero o verde, mamãe!".
Nunca tinha notado, mas havia uma pequena teia de aranhas no canto superior esquerdo da sala de estar, próximo ao quadro pintado pelo 'amigodaprimadeseuavô', tanto faz.
Tudo hoje parecia diferente. Parecia que estava percebendo coisas antes jamais vistas. Como quem as vê pela última vez.
Caminhou mais, abriu uma gaveta. Tateou à procura de algo. Ao encontrar, guardou o achado no bolso. Continuou a redescobrir o apartamento. Só que agora, o tinha.
O corredor nunca pareceu tão comprido.
Foi à janela, olhou as pessoas lá fora. "Essa sempre foi a melhor janela".
Passou os dedos pela mesa, deixando sua marca na fina camada de poeira.
"Leve, leve, muito leve,
Um vento muito leve passa,
E vai-se, sempre muito leve.
E eu não sei o que penso
Nem procuro sabê-lo."
Pegou o copo azul, seu favorito, e encheu com água. Retirou o pequeno comprimido do bolso. Havia chegado a hora.

Mas, depois, deu-se conta que era apenas placebo. E, ao perceber, já era tarde demais. Havia perdido o momento, que jamais retornaria.

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