sábado, 5 de julho de 2008

Inesperado encontro

As crianças corriam pelo quintal, algumas faziam castelos de terra, terra batida, barro vermelho por ali, Maria, não coma seu bolinho de areia! Ela via tudo passar, lembrava dos tempos dela, bons tempos.
O pomar, cheinho de frutas, algumas pedindo para serem retiradas, como se implorassem pelo roubo, e ela subia, subia como a pequena menina que passava correndo por ela, nese momento, ah, aquela saudade do tempo bom.
Via tudo aquilo construído, aquilo que agora era parte dela, a família no grande sítio, e era ela, matriarca, elo daquela grande união. Via tudo com aqueles olhos de menina fascinada, a idade dos olhos, ah, não era a idade que os ossos acusavam, já não andava como antes.
Mas estava só, universo aos seu redor, e ela só. Pensava nas jabuticabas, apenas não tivera uma Emília que a levasse com pó de pirlimpimpim, mas tivera as jabuticabas.
Hoje, naqueles olhos cansados, naquelas rugas, formava-se um sorriso. O pequenino vinha ao seu redor, dizendo que a amava, ela também o amava.
Com ela falavam, ela respondia com um aceno leve de cabeça, concordando com os absurdos desconhecidos que a ela eram ditos, cada palavra correndo de seus ouvidos, ou seriam seus ouvidos que corriam das palavras?
O pensamento, distante, encontrando-se consigo mesma, com ela no passado, aquela doce nostalgia, lembrando que tivera uma galinha chamada Felicidade, mas Felicidade havia morrido, ah, como chorou. Parecia que Felicidade era única, insubstituível, mas com o passar dos anos passou a ver que felicidade havia em outros lugares.
Lembrava da doce voz da mãe que embalava seus sonhos com cantigas que contavam lendas de sereias.
Adorava o céu, a fascinava sempre. Aprendera com o avô a respeitar as estrelas, a querê-las bem, a amá-las. Tão fascinada pelo seu que fizera o próprio céu na terra, através do brilho dos olhos de outrem.
Mas apesar da doce vida, havia o maior sonho em seu coração que permanecia em não se realizar: voar. Queria conhecer as alturas, voar para longe, a mente voava, ela não, não se sentia leve o suficiente.
Mas hoje, estranhamente, sentia-se leve. Voaria para longe? Sim, haveria de ser hoje, sentia algo diferente, as cenas, tudo aquilo, voaria.
O vento a soprou para tão distantes lugares, lembrava dos pormenores de uma vida que valera a pena, e sentindo-se feliz encontrou-se consigo mesma.
Fechou os olhos e dormiu.

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